Pais e filhos: de "A Viagem de Chihiro" a "Os Sete Samurais"
08/04/13 15:19Aos 2 anos, você quer sair do cinema, chorando, com medo do que acontece com os pais da protagonista do filme. Aos 12, você está pedindo um clássico japonês ao atendente da videolocadora.
O “você” dessa história é o palmeirense Guilherme, 12 anos, filho mais velho da jornalista, diretora, roteirista e montadora Selma Perez, 43.
Autora do livro de contos “Quem Dera Ter Tempo” (2011), Selma abre nesta quarta-feira, dia 10, às 18h, a instalação e exposição de fotos “Casa Vazia” no espaço Casa Pássaro (Rua Girassol, 174, São Paulo).
No relato abaixo, ela conta como apresentou o cinema ao Guilherme e como a tal magia da sala escura o assustou. Anos mais tarde, final feliz:
Adoro cinema! Mesmo em tempos de TV a cabo, Netflix, Youtube, Vimeo etc., continuo frequentando as salas de cinemas uma ou duas vezes por semana. Claro que, quando meu primeiro filho nasceu, pensava no momento em que poderia dividir com ele a experiência da salona escura. Quando ele fez dois anos, “A Viagem de Chihiro” (2001) entrou em cartaz. A vontade que eu tinha de assistir ao filme e, ao mesmo tempo, o desejo de levá-lo pra conhecer aquele mundo encantado do cinema não me deixaram perceber que ainda era cedo. Ao menos para aquele tipo de filme. Ao menos para o meu filho Guilherme.
O fato é que, na época, talvez a ansiedade tenha sido maior e fomos eu, meu marido e Guilherme assistir a “Chihiro”. Ele estranhou o lugar, como a maioria das crianças, mas logo sossegou e começou a prestar atenção no filme. Não parecia gostar nem desgostar, até que os pais de Chihiro são transformados em grandes porcos ao comerem em uma das casas daquele mundo fantasmagórico, onde os seres humanos não eram benvindos. Ele começou a chorar e pediu pra sair do cinema. Saímos e ele disse que não gostou de ver os pais da menina virarem porcos. Nem a minha tentativa de explicar que no final eles voltariam a ser os pais novamente surtiu algum efeito. Ele não gostou e pronto!
Resolvemos então esperar algum tempo. Dois anos mais tarde, fomos assistir a “Procurando Nemo” (2003). A cena se repetiu, e assim que o pai se perdeu do filho, choradeira e pedido pra sair. Vendo tantas crianças menores do que ele na sala, ficou a sensação de que talvez Guilherme não fosse compartilhar do nosso gosto pelo cinema. Claro que não foi nada disso. Cada um tem uma sensação e uma relação bem diferente com o cinema. No caso do Gui, o tempo foi passando, e ele foi descobrindo as histórias que o atraem, foi desenvolvendo e refinando seu gosto pelos filmes – ficção e documentários. Enfim, ele foi descobrindo a magia do cinema a seu modo.
Hoje, aos 12 anos, já freqüenta os cinemas com os amigos e busca seus próprios filmes na videolocadora ou na internet. Da última vez que alugamos filmes, qual não foi minha surpresa quando Guilherme perguntou ao atendente se ele tinha “Os Sete Samurais” (1954). Vendo a idade do garoto ali na sua frente, o moço foi logo dizendo: “Mas isso é Kurosawa, garoto!” E Gui respondeu: “Eu sei, eu quero ver o original, porque acabei de assistir ‘Sete Homens e um Destino’, que é a refilmagem”. Assistimos em casa, todos juntos, ao filme de Kurosawa que, segundo Guilherme, é muito melhor do que as versões que vieram depois. E quem vai contestar? Gosto é gosto.
Céus, que orgulho…..