A sala itinerante do Cine Tela Brasil, com 225 lugares
O diretor e roteirista Luiz Bolognesi e sua mulher, a diretora Laís Bodanzky, criaram em 2004 o Cine Tela Brasil, projeto de exibição gratuita e itinerante sobre o qual falo em texto publicado na edição de hoje da “Folhinha”.
Em julho, a sala do Tela Brasil (com 225 lugares) circulará por seis regiões da Capital: Sé, Largo da Batata, Parada de Taipas, Jaçanã, Capão Redondo e Cidade Tiradentes.
A seguir, trechos da entrevista que fiz nesta semana com Bolognesi — muito feliz com a carreira internacional da animação “Uma História de Amor e Fúria” (classificação indicativa: 12 anos), recentemente premiada no tradicional e concorrido Festival de Annecy (França), e que está na programação de julho do Tela Brasil.
Podemos dizer que o Cine Tela Brasil é um filho de outro projeto seu e da Laís, o Cine Mambembe (1995-2004)?
Totalmente. O Cine Mambembe era mais voluntário. Rodamos 13 mil quilômetros, em mais ou menos 15 estados das regiões Sudeste, Norte e Nordeste. Só exibíamos curtas. Se havia muita criança na sessão, sacávamos e exibíamos “Novela” (1992), de Otto Guerra, uma animação com jacarés que tira sarro de telenovelas, de morrer de rir, e “A Velha a Fiar” (1964), de Humberto Mauro, que também funcionava muito bem. As crianças cantavam junto. Esses filmes faziam muito sucesso com todos as plateias: urbanas, rurais, indígenas.
O Tela Brasil é a profissionalização do Cine Mambembe. Desde 2044, já alcançou quase 1,3 milhão de espectadores. E desde o começo pensamos em filmes de classificação indicativa livre. Mais da metade do público tem menos de 14 anos. A molecada sai de uma sessão e vai para a fila da próxima. Às vezes, veem quatro filmes no mesmo dia. Adulto não faz isso. Às vezes tem tanta criança que alteramos a programação. Avisamos que vamos passar outro filme por causa da maioria.
“Tainá” 1 (2001) e 2 (2004) são os nossos campeões de público, seguidos por “Lisbela e o Prisioneiro” (2003) e “Rio” (2011). Todo mundo adora “Tainá”. Nosso sonho de consumo é o terceiro filme da série, mas o distribuidor ainda não liberou. Estamos fazendo também sessões fechadas para escolas, com material didático.
Quais os critérios para escolher os filmes do projeto?
“Eu e Meu Guarda-Chuva”, na programação de julho do Cine Tela Brasil
Um grupo do Tela Brasil formado por gerentes, coordenadores, por mim e pela Laís estuda os filmes lançados no último ano e meio. Buscamos filmes de qualidade que promovam entretenimento e reflexão. “Gonzaga” (2012), por exemplo, é perfeito. “Eu e Meu Guarda-Chuva” (2010), também. Depois, negociamos com os distribuidores. Muitos são bacanas. Outros são irredutíveis. Botam o preço lá em cima e inviabilizam a exibição. Nem todos os distribuidores têm noções de responsabilidade social.
Por que poucos filmes infantis são produzidos no Brasil?
Produzimos quase nada de filme infantil. Não chega a três longas entre os 80 feitos por ano. É muito pouco. Nós mesmos, produtores, esquecemos. Falo por mim: existe entre nós um certo preconceito, como se filme para crianças fosse algo menor. Não entendemos o passo que é dado com um filme infantil. Ele não ganha prêmio em festival, mas vai ser importante porque está formando espectadores. É uma pena, porque os infantis vão bem de público, têm vida longa no DVD. É preciso abrir os olhos e ver um caminho. A animação é uma das áreas que mais crescem.
Recentemente, escrevi com três roteiristas franceses o roteiro de “Planeta Verde”, um “live action” com animais rodado em 3D na Amazônia e lançamento previsto para 2014. É a história de um macaquinho de circo que cai na Amazônia e precisa aprender a ser bicho. E aí tomei bronca em casa das minhas filhas [de 10 e 8 anos]: “Finalmente, pai, você fez um filme que a gente pode ver”.
E você não pensa em dirigir um filme para crianças?
Tenho vontade de fazer um, em 2015/2016. Um filme sobre a história do Brasil vista a partir de São Paulo, sobre quem somos nós, para a família toda, com protagonistas crianças. Depois do prêmio em Annecy para “Uma História de Amor e Fúria”, aumentaram as possibilidades de fazer esse outro. Estamos começando. É tudo muito lento. Mas, como o prêmio em Annecy confirmou, esse é o jeito certo de fazer.
Há alguma dificuldade especial em escrever filmes infantis? Alguns dizem que a criança é um público mais exigente do que o adulto.
Penso na criança como um pequeno adulto. Em “Planeta Verde”, a maior dificuldade foi que o protagonista é um macaco que não fala. Eu pensava nos problemas dele. O grande erro é infantilizar o raciocínio das crianças. Eu me surpreendo com as minhas filhas o tempo todo. Crianças estão mais livres de preconceitos do que nós. São muito livres e sensíveis. Tratamos as crianças com ti-ti-ti, e o raciocínio delas está lá na frente. Entendem tudo. São surpreendentes. Crianças dão de 10 a 0 nos adultos. Se não gostam de um filme, saem no meio. Mas, quando gostam, veem a semana inteira.